quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Poeta castrado não!

Lendo e relendo a sugestão de um leitor e colaborador deste blog, e à imagem daquilo que gostaríamos que todos os interessados fizessem deixo:

Serei tudo o que disserem
por inveja ou negação:
cabeçudo dromedário
fogueira de exibição
teorema corolário
poema de mão em mão
lãzudo publicitário
malabarista cabrão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!

Os que entendem como eu
as linhas com que me escrevo
reconhecem o que é meu
em tudo quanto lhes devo:
ternura como já disse
sempre que faço um poema;
saudade que se partisse
me alagaria de pena;
e também uma alegria
uma coragem serena
em renegar a poesia
quando ela nos envenena.

Os que entendem como eu
a força que tem um verso
reconhecem o que é seu
quando lhes mostro o reverso:

Da fome já não se fala
- é tão vulgar que nos cansa -
mas que dizer de uma bala
num esqueleto de criança?

Do frio não reza a história
- a morte é branda e letal -
mas que dizer da memória
de uma bomba de napalm?

E o resto que pode ser
o poema dia a dia?
- Um bisturi a crescer
nas coxas de uma judia;
um filho que vai nascer
parido por asfixia?!
- Ah não me venham dizer
que é fonética a poesia!

Serei tudo o que disserem
por temor ou negação:
Demagogo mau profeta
falso médico ladrão
prostituta proxeneta
espoleta televisão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!

Ary dos Santos

A "voz" interventiva de Ary dos Santos, escritor de canções com letras profundas e interventivas, escreveu até letras de canções vencedoras do Festival da Canção em Portugal.

JR

2 comentários:

Anônimo disse...

É belíssimo este poema! E dito pelo próprio, ainda melhor!
Tive o privilégio de o ouvir. Foi ARTE.
Obrigada por partilharem connosco.

Anônimo disse...

Deixei outra sugestão nos vossos mails. Vale o que vale.
Bxos aos 2